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Cortes Lentos

Este blog reúne o trabalho literário da escritora capixaba-carioca Isabella Mariano.

às vezes, eu sinto falta do mundo pequeno. mas isso não dura muito. quanto mais sei, mais quero saber. quanto mais caminho, mais quero chegar. a questão é que nunca chego. não tem fim a caminhada, até que o fim venha inesperado, não planejado. o que dá pra planejar é a vida, e ainda assim se acostumar a ser surpreendida com os descaminhos e as portas fechadas.

eu cresci habituada a estar em movimento. cresci com o barulho, o medo, a violência, o caos. quando pude ser eu mesma a minha mãe, busquei silêncio, e o mundo pequeno me pareceu seguro. o mundo pequeno me pareceu mais controlável.

mas é mentira que viemos para governar. nada é governável. a gente só encena bem grandes farsas. a natureza é rebelde por essência. da minha ingovernável natureza, veio o desejo do mundo maior. e quanto mais o mundo aumenta, mais eu me sinto menor - e diferente do que se pode supor isso me causa certo alívio.

sinto que não devo mais nada - se é que algum dia devi. se é que podemos falar nesses termos, quando o assunto é amor. ou algo parecido com ele. sinto que tenho fechado portas eu mesma, para que meu outro eu não queira voltar. mas a gente sempre tenta, né? voltar pro útero, voltar pro colo.

e percebe que não tem colo. e não tem útero. não tem vida para onde voltar. só temos para onde ir. e eu quero seguir descobrindo, nos cantos do mundo, aonde é que eu posso chegar.

ela adora chegar quando não é convidada

apenas aparece e se instala

às vezes, ouço seus gritos de longe

seu andar pesado

sua respiração ofegante

o coração acelerado

e o peso na cama à noite

mas, às vezes, ela vem soturna

quando estou feliz na mesa do bar

no parque

no banheiro

lendo um livro

no cinema

ela chega sem aviso ou convite

essas são suas piores visitas

ela me reconhece 

e eu me desconheço

a dormência dos meus lábios

e as pálpebras que pesam uma tonelada

o silêncio parece ser seu único amigo

- mas ele é meu amigo também -

de longe, porém, ouço um sussurro

que saiu do bico de um pássaro preto

há milhares de anos atrás

chega a mim feito uma brisa e ordena

ele me manda voar, ele diz:

voa, voa, voa, que isso também há de passar

eu tenho o costume de usar as palavras erradas. não digo como um costume de fazer caminhadas ou tomar café preto todo dia logo cedo. digo costume, de costumeiro, de ser comum, frequente, sabe? - penso se é a palavra certa. - não são raras as vezes em que sinto que preciso me explicar. dizer que não foi exatamente aquilo o que eu quis dizer, mas que eu, de alguma forma, disse. logo eu, que sempre quis ser conhecida pelo dom com as palavras. 

já faz um tempo que a palavra não tem dado mais conta de mim. o que eu tenho a dizer muitas vezes extrapola os limites da linguagem que sei. aí vou dizer que é magia, oração, mas nem é pra tanto. quanto mais próxima estou do que eu quero dizer, menos sei as palavras certas para dizê-lo. tem vezes que não entendo simples construções frasais. sujeito, verbo, predicado. e faço perguntas estúpidas como uma criança que mal conhece o mundo, ainda. confesso certo prazer em dizer que não entendi.

há momentos, porém, em que uma metáfora dá mais conta da minha realidade do que um objetivo retruque ao seu cínico "ei, tudo bem?". me desculpo pelas palavras demais. me desculpo pelas palavras de menos. me culpo por falar e por não falar. e foi nesse caminho que comecei a perceber a limitação da palavra. 

palavra é como um invólucro, um patuá. palavra é amuleto. acho que eu já disso isso outrora. ou outro alguém disse. que diferença faz? palavra expande, enquanto limita. palavra engrandece, enquanto diminui. é a limitação da forma. e a limitação da forma é justamente meu tropeço. é onde eu vejo que nem sempre terá palavra pra tudo e me perco nas significâncias todas, tentando dizer que te amo, que não te quero mais, que te quero perto mas nem tanto, não percisa me tocar hoje, ah mas hoje eu vou te comer, não, sim, talvez, é, desculpa, perdão, bom dia, preciso de ajuda, não preciso mais. 

é tanta coisa pra dizer toda hora que cansa. quero é observar por cima da palavra, no ombro da palavra, sabe? acessar o que você quis dizer, em vez do que exatamente disse. chame de discurso, de alma, de intenção. tanto faz a palavra. quero ver onde é que elas se formam em você. "além do nome", disse adélia. quero ver o que está além das suas vírgulas todas, seu abismo me interessa mais do que as desculpas que você dá para que ninguém possa entrar...

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Isabella Mariano
Isabella Mariano nasceu em 1992, no Rio de Janeiro, mas logo se mudou para Vitória. É jornalista, escritora, designer e mestre em Comunicação e Territorialidades. Em 2013, publicou o livro "gotas" e, em 2015, o "Cortes Lentos" - ambos de poemas.
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