Ósculos de 99

Nunca me esquecerei do verão de 99. Eu havia decidido visitar Búzios com algumas acompanhantes aventureiras. Foi uma espécie de loucura independente. Estávamos livres de tudo. Fizemos as malas e eu fui dirigindo, no início. Depois nós revezávamos.
A primeira parada foi em uma lojinha de comida. A fome apertava e era um desespero. Parecia um maná dos deuses, aquele pão com presunto e queijo. Voltamos a estrada e depois de umas horas, chegamos em Búzios, definitivamente, exaustas. O vento não era problema, mosquitos não eram problema, nada nos impediria de dormir!
Achamos a pousada onde havíamos reservado um quartinho pela internet. Era confortável, simples e pertinho da praia. Entramos no quarto e nem nos preocupamos com malas ou banhos. Apenas deitamos para dormir. Eram 17h, o Sol indo embora e o meu sono estava com preguiça de chegar. Comecei a ouvir um rastro de música e farejei.
Da varanda, via um grupo de jovens, loucos como somos, iniciando, precocemente, um lual. Comendo na pousada e, provavelmente, iriam para a praia depois.
Eu estava descabelada, mas nessa idade a gente nem liga mais para o que irão pensar. Fiquei olhando, como quem quisesse estar lá, como quem queria ser convidada. Um rapaz me viu. Não sei se já estava me olhando, mas só o percebi quando ele levantou da cadeira e se direcionou para perto da minha varanda. Ele, devido a sua gentileza, perguntou se eu queria participar e disse que se chamava Jorge. Eu morri de rir, ele não entendeu.
Tomei banho e saí com eles. As meninas dormiam igual pedra! Só amanhã que eu as veria em sã consciência.
Fui ao encontro daquela galera imensa e sorri um riso agradável. Cantei as músicas e até toquei um pouco do que sabia. Às 20h, estávamos na praia. Eu achei Jorge uma figura diferente. Porque até as 20h ele estava usando óculos escuros. Lembro-me que sempre que, por distração, seu nome me fugia a mente, eu o chamava menino dos óculos escuros. Era o único. Era único.
Nessa hora, os casais já estavam abraçados e os outros ainda tentavam tocar violão, filosofar, rir e se divertir. Sentei ao lado de Jorge, numa ponta da areia que me confortou. Encostei a cabeça nos joelhos e procurei algumas conchas, só para passar o tempo.
Ele ficou me olhando, sorrindo. Eu sei, porque dei uma espiadinha. Depois, parei de mexer na areia e fiquei olhando-o. E ele disse que a lua não era nada em comparação ao azul dos meus olhos.
Um convite, fajuto, adolescente e pobre para um beijo. Mas, na hora, foi lindo. Eu precisava de qualquer palavra de carinho. Um beijo sincero, um abraço amigo. Mesmo com palavras clichês ou redundantes. Eu estava satisfeita com o presente que a Lua me deu.
Foi linda a noite. Às 5h da manhã, eu estava dormindo em seu colo, ele me despertou e disse para voltarmos. Fui andando, meio sonolenta. Ele me deixou no quarto e eu dormi, tranquilamente. Sentia-me amada. Um amor lindo.
Minhas amigas acordaram às 6h, mas eu não quis levantar. Depois do almoço, quando despertei, havia uma rosa em meu travesseiro. Perguntei a balconista sobre um rapaz, de óculos escuros, chamado Jorge. Ninguém sabia. Ninguém viu.
Mas eu sabia, eu senti, eu o vi. E nunca vou me esquecer do rapaz de óculos escuros. O rapaz e os ósculos, também.

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3 Comentário(s)

  1. É de um breve amor amado,
    que aconchega e chega
    aos pequenos passos,
    pelos olhos miúdos...
    Pela brisa leve do mar...
    Lindo!

    Bjuss

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  2. com 16 tá assim? imagina com 26. Seu texto é enxuto, sem palavras demais, tem ritmo bom. Além de início, príncipio...tem fins!

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