Lembrança

Trocentos, quinhentos, seiscentos, seilá. Só conseguia pensar em quanto tempo você conseguiu me esquecer, de maneira tal que meu nome era estranho a sua mente e vocabulário. Esqueceu. Completo. Cem por cento. Zero, vígula, zero, um. E agora, eu penso, cuidadosamente, se devia voltar e perguntar se está tudo bem. Tola! Eu ainda penso em você, em falar com você, em seu nome, em seu número, em seu número de meias azuis, os pares perdidos, as unhas roídas. Penso nos cachos mal feitos, nos dedos tortos, na cicatriz retorcida. E é esse o pior. Que eu não me esqueço. Quantos dias mesmo que eu disse? Trocentos! Sei lá que bosta de número é esse. Inexistente. Talvez tenha sido assim. Não houve tempo parar me esquecer, porque nem ao menos tempo teve para que me lembrasse. E me vivesse, e me cheirasse. Que há? Esqueceu, dos meus pares de meia! Das vermelhas que eu usava. Enquanto fico aqui pensando nos seus olhos cor de mel, no azul, que eram as suas blusas preferidas. Pensando nos traços perfeitos do seu rosto e em como o mar parecia maior em seus olhos. Pensando em tudo o que fomos nós há trocentos anos atrás. Trocentos destroçados. Ossos do ofício, como diria o trocadilho. Que me esqueça, para que eu não queira deixar de te esquecer.

You May Also Like

1 Comentário(s)

  1. o desbocar das palavras do tempo me chamaram a atenção. levissímo! a forma de dizer tbm.

    ResponderExcluir